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Dimensionamento de estufas de bettas com controle genético

Atualizado: 29 de nov. de 2023

Dimensionar estufas de peixes ornamentais, especialmente de bettas, requer planejamento e visão a médio e longo prazos. Isto porque o número de peixes tende a aumentar muito, uma vez que a quantidade de alevinos que sobrevivem a cada ninhada aumenta de acordo com o manejo do criador e sua experiência.


Via de regra, o criador inicia com um casal de bettas e possui um aquário para o acasalamento e outro para o crescimento dos alevinos. Além disso, possui acomodações que são utilizadas para as matrizes quando separadas. Também poderá usar aquários ou caixas plásticas de tamanhos diferentes, o que dificulta a padronização e melhor utilização do espaço disponível.

Quando se dimensiona uma estufa de criação de peixes, deve-se ter claro o objetivo da estufa quanto ao tipo de criação: criação sem controle genético das linhagens ou criação com controle genético certificado das linhagens.


A criação sem controle genético das linhagens reduz drasticamente o número de acomodações para os peixes (aquários ou caixas plásticas); alevinos de ninhadas diferentes são acomodados juntos, o que resulta na perda de lastro de seus ascendentes (ou matrizes). Ou seja, os alevinos são acomodados de acordo com seu tamanho, todos juntos.


Por outro lado, o dimensionamento de estufas de bettas com controle genético certificado requer mais recursos, tanto em espaço como em investimento e esforços para a realização do controle.


Conceitos básicos


Antes de iniciarmos o detalhamento dos procedimentos e premissas para o dimensionamento de estufas de bettas com controle genético, que é o propósito deste artigo, é importante a apresentação de conceitos que serão usados neste trabalho, os quais serão adaptados e simplificados para o propósito deste artigo, de maneira que mesmo iniciantes no mundo dos bettas possam compreender.


Observação: é possível que numa primeira leitura o texto pareça pesado, com muita informação – principalmente para iniciantes. É importante que você releia, neste caso, este artigo para sua total compreensão. Temos consciência desta dificuldade. Entretanto, é o que se apresenta.


Ainda, gostaríamos de sugerir que você imprima este artigo e o tenha para estudo e releitura posterior. Faça anotações complementares para seu maior entendimento. Só assim o sucesso terá maior chance de ser atingido. Vamos lá!


F1, F2 e F3: corresponde à geração de bettas em foco ou análise, a partir dos pais; Consanguinidade: parentesco entre os que descendem de um mesmo pai ou mãe; Inbreeding: corresponde ao cruzamento de bettas com alto grau de parentesco, resultando numa consanguinidade mais intensa.

Line breeding ou cruzamento em linha: consiste no cruzamento de bettas com baixo grau de parentesco. É um meio-termo entre o inbreeding e o out-cross. Out crossing: trabalha-se com bettas sem consanguinidade próxima, com introdução constante de diferente material genético. Linha de sangue (L1, L2 e L3): grupo de bettas que formarão um grupo fechado de indivíduos que se acasalarão ao longo de gerações (F2, F3);


Neste artigo detalharemos o dimensionamento de estufas de bettas com controle genético certificado/consistente. Este tipo de trabalho se apoia em premissas.


Vejamos:


Premissa 1: quanto ao manejo

  • ninhadas de bettas levarão de dois a três meses para se desenvolver, desde o nascimento até sua colocação em beteiras individuais. Para fins práticos, daremos o prazo de três meses para ocupação dos tanques, devido aos retardatários;

  • uma ninhada será sempre separada em dois aquários, ou caixas de crescimento (caixas plásticas) - chamados de tanques;


Premissa 2: quanto às linhas de sangue dentro de uma mesma linhagem

  • haverá, sempre que possível, três linhas de sangue distintas;

  • em cada uma só poderemos avançar até F3;


Premissa 3: outros pontos importantes a considerar no dimensionamento

  • a quantidade de linhagens que serão trabalhadas simultaneamente;

  • linhagens diferentes poderão crescer em um mesmo tanque, desde que o desenvolvimento dos alevinos seja compatível (alevinos de mesmo tamanho) e seus fenótipos complemente diferentes entre si. Exemplo: linhagem de vermelhos coexistindo com linhagem de azuis;

  • linhagens com fenótipos visualmente semelhantes não poderão ficar juntas em um mesmo tanque. Exemplo: linhagens copper e black copper. Isto porque de ninhadas de bettas black copper sempre podem surgir bettas copper;


Procedimento para criação de bettas com controle genético certificado/consistente


a) obtido o casal desejado, efetuamos o cruzamento, colocando-o dentro do tanque 1 (TQ1). Assim iniciamos a nossa linha de sangue 1 (L1).


b) retira-se as matrizes após a conclusão do processo de acasalamento, colocando-as nos tanques individuais;


c) a ninhada resultante deste acasalamento (F1) ficará junta durante quinze dias no TQ1 e, depois disso, 50% dos indivíduos serão colocados em outro tanque (TQ2), onde permanecerão durante três meses para seu crescimento e desenvolvimento, da mesma forma que aqueles no TQ1. Como é possível haver a ocorrência de alguma doença, ou um acidente em um dos tanques, que leve à perda da ninhada, é um prudente seguir este procedimento. É mais uma questão de segurança, só isso. Caso não haja tal possibilidade, ignore a redundância.


d) beteiras deverão ser disponibilizadas para acomodar os machinhos que forem se destacando. Recomenda-se muitas plantas flutuantes (samambaias d’água, p.ex.) nos tanques TQ1 e TQ2 para evitar estresse entre os bettas. Nesse ponto, temos beteiras com o pai, a mãe e as beteiras para os machinhos.


e) deverão ser escolhidos: – uma fêmea para continuar L1 em F2; – um irmão para cruzar com ela, e continuar L1 em F2; – uma outra para voltar no pai e criar a linha de sangue 2 (L2);

– separar outro casal de irmãos como segurança (reserva) dos itens anteriores;

f) doar ou vender todos os demais irmãos que estejam em TQ1 e TQ2, visto que não serão mais usados nas gerações seguintes no trabalho na estufa.


Esse procedimento deverá ser seguido em qualquer linha de sangue, e em qualquer geração “F” dentro dessa linha. Dessa forma, teremos no mínimo 7 aquários individuais distribuídos da seguinte maneira:

· pai;

· mãe (embora possa não ser mais utilizada – ou só em caso urgente);

· macho (que continuará L1);

· fêmea (que continuará L1);

· macho (reserva);

· fêmea (reserva) e

· fêmea (que iniciará a L2).


Considerações sobre a seleção das novas matrizes: Repare que não se pegou uma mesma fêmea para iniciar L2 e continuar L1. Deste modo, evita-se um aumento na taxa de consanguinidade, pois mesmo entre irmãos, sempre haverá algumas diferenças nas cargas genéticas.


Não se utilizou a fêmea mãe matriarca para cruzar com um filho dela, pois na maioria dos casos, as fêmeas crescem muito, engordam, e os filhos não conseguem acasalar. Mas nada impede, caso seja possível tal acasalamento. Será outra linha que surgirá. Neste trabalho não será cogitada tal possibilidade, mas depois de entendida a filosofia de trabalho aqui apresentada, fique à vontade para dimensionar a estrutura necessária com tal variável.


A partir do procedimento inicial (e repetitivo) entre as gerações para o dimensionamento da estufa, já obtemos neste ponto F2 na L1, e F1 na L2, onde:

  • na F2, L1 foi obtido com o cruzamento de dois irmãos F1;

  • na F1, L2 foi obtido com o cruzamento do pai com a filha (da L1 em F1).


Veja o diagrama abaixo:



Nesse ponto, pegamos um macho da L1 em F1 (de preferência, aquele que ficou como reserva e que não foi utilizado) e cruzamos com uma fêmea da L2 em F1, gerando a linha de sangue L3.


Questão: por que não cruzar um macho da L1 em F2, em detrimento do macho da L1 em F1?


Aqui cabe um leque de discussões e dependerá sempre da qualidade do material genético que está surgindo (fenótipos). Se o macho da F2 da L1 for melhor que aquele da F1 da L1, pode-se naturalmente utilizá-lo e desfazer-se do outro. Porém, se a diferença não for muito significativa, a “distância genética” (perda da carga genética ou hereditariedade) do F1 da L1 será maior do que aquela do F2 da L1 para a geração da fêmea F1 da L2.


Esse fato não está ligado à idade, e sim a um maior afastamento dos conjuntos de genes (cargas genéticas) de ambas as gerações e linhas de sangue distintas, dando chance a outras combinações diferentes de genes, com menor atuação dos genes “nocivos” que podem surgir desses acasalamentos entre parentes muito próximos, devido à alta consanguinidade.


Pelo menos, vejo dessa maneira, sem qualquer base científica que me ampare nesta afirmativa. Minha experiência de anos, pelo menos, constatou tal tendência.

Pelo exposto, vemos que a utilização de um macho da L1 em F1 apresentará uma L3 com uma carga genética menos fechada do que aquela utilizando um macho da L1 em F2.


Qualquer que seja a escolha para gerar L3 utilizando-se uma fêmea da L2 em F1 com um macho da L1 – L1 em F1 ou L1 em F2 –, temos como resultante:




Chegamos em F3 na linha de sangue 1 (L1)


Neste ponto, temos as seguintes considerações importantes:


a) de acordo com a premissa 2, ao se atingir F3 em qualquer linha, há a necessidade de se fazer um “outcrossing” – uma abertura total de linha de sangue –, para se iniciar novamente aquela linha.


b) nesse caso, a L1 – como já era esperado – atingiu primeiramente essa marca. Pode-se abrir essa linha com um indivíduo (um macho ou uma fêmea, não importa) de outro criador. Essa matriz deve ser o mais possível afastada geneticamente daqueles com os quais se esteja trabalhando do ponto de vista de parentesco. Ou seja, nenhum parentesco entre o casal é a situação desejada.


Então, podemos mostrar a evolução do cronograma de cruzamentos:





Repare que a mesma discussão que se fez poderia ser reaberta aqui, no tocante aos “novos ciclos” das linhas de sangue L2 e L3.


Questão: mas por que não utilizar indivíduos mais afastados geneticamente em detrimento daqueles mais próximos?


O novo ciclo da L2 poderia ser desenvolvido com indivíduo da L3, mas em F1 ao invés de F2, por exemplo. O mesmo raciocínio poderia ser aplicado ao novo ciclo da L3, lançando-se mão de indivíduo da F2, ao invés de F3 (ou mesmo da F1).


Isso implica maior quantidade de beteiras disponíveis para acomodar esses indivíduos, de forma a tê-los à disposição no momento exato.


Com essa estratégia, pode-se continuar o trabalho de forma segura e continuada.

Considerações finais


a) não podemos nos esquecer que a qualquer momento podemos lançar mão de aberturas de sangue, ou mesmo, cruzamentos entre linhas distintas de sangue(line breeding), sem a obrigatoriedade de se chegar até F3. Vai depender dos resultados obtidos em cada caso.

b) o mesmo se aplica a se avançar adentro de cada linha (inbreeding) e passar, nas gerações, de F3 (F4, F5 etc.). O cuidado que recomendo ter para este último tópico é a observação cuidadosa dos resultados estruturais das ninhadas, independente de qual grau “F” esteja aquela linha de sangue. Possíveis aumentos nas quantidades de indivíduos defeituosos:

· fracos;

· doentes;

· exemplares com pouco desenvolvimento;

· aparecimento de calombos ou cavidades no corpo – especialmente na cabeça;

· bettas apresentando o dorso protuberante (cabeça de golfinho e muito “bicudos”);

· nadadeiras tortas (ou a ausência das mesmas)

· corpos desproporcionais comparando-se o conjunto de nadadeiras (falta de equilíbrio estético, onde o betta apresenta corpo pequeno e nadadeiras imensas, ou corpo enorme e nadadeiras pequenas).


c) preferencialmente, fotografar todos os bettas com os quais se tenha trabalhado visando a mesma qualidade e característica de imagem/foto: mesma câmera e ajustes, mesma iluminação e aquário, com transparência do vidro e da água. E ainda, caso a linhagem seja de bettas metálicos, ou com alto índice de iridescência, estas condições se tornam ainda mais necessárias.

d) cabe lembrar que todo esse trabalho foi desenvolvido para uma única linhagem! Caso desejemos trabalhar com mais de uma linhagem, multiplicar todas as quantidades envolvidas pelo número total de linhagens.


Quanto ao número de beteiras necessárias, deixarei a quem desejar aplicar as informações e recomendações contidas nesse trabalho a tarefa de dimensiona-las, pois dependendo da opção filosófica que utilizar, esse número poderá variar bastante.


É claro que, caso o seu manejo não seja apropriado para possibilitar um desenvolvimento adequado aos seus bettas, de tal forma que os tempos de 3 meses não sejam suficientes para sua realocação destes em beteiras individualizadas, todos os tempos totais mudarão, mas não as posições relativas das ocupações dos aquários e tanques nos cronogramas. Ou seja, o cronograma vai se alongar.


Uma estratégia à parte é que, quando se chega em F3, em qualquer trabalho, com 3 linhas de sangue, p.ex., ao invés de “out crossing”, com bettas de outros criadores que muitas das vezes não temos a informação no que diz respeito a seus históricos genéticos e, por isso mesmo, poderemos colocar todo o nosso trabalho a perder.


Nesses casos, poderemos fazer “line breeding” (troca de exemplares entre linhas de sangue) com as três linhas, da seguinte maneira:




O que guiará na escolha se será o macho da linha 1 com a fêmea da linha 2, ao invés do macho da linha 2 com a fêmea da linha 1, p.ex., será a qualidade mostrada nos respectivos fenótipos (formatos, cores, e distribuições das cores), e também, o seu objetivo a ser alcançado com aquele trabalho específico.


Nesse caso, teremos os novos F1: L1 com L2, L1 com L3, e L2 com L3.


Também poderá ocorrer o caso onde os resultados apresentados em determinada linha não estejam de acordo com os seus objetivos, o que levará ao abandono dela, com descarte total, e a trabalhar com uma linha a menos.


Desejamos sucesso com seus Bettas!


Referência:

[1] Arquivo interno Betta Project.

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